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Póvoa de Varzim


Depois de quinze dias passados na Póvoa de Varzim, regresso finalmente a Braga.
Para lembrar, fica o prazer indescrití­vel de ouvir o poema seguinte recitado por Aurelino Costa...


Lusitânia no Bairro Latino, por António Nobre

"2.

Georges! anda ver meu paí­s de Marinheiros,
O meu paí­s das naus, de esquadras e de frotas!

Oh as lanchas dos poveiros
A saí­rem a barra, entre ondas e gaivotas!
Que estranho é!
Fincam o remo na água, até que o remo torça,
À espera da maré,
Que não tarda hi, avista-se lá fora!
E quando a onda vem, fincando-o a toda a força,
Clamam todas à uma: «Agora! agora! agora!
E, a pouco e pouco, as lanchas vão saindo
(Às vezes, sabe Deus, para não mais entrar...)
Que vista admirável! Que lindo! Que lindo!
Içam a vela, quando já têm mar:
Dá-lhes o Vento e todas, à porfia,
Lá vão soberbas, sob um céu sem manchas,
Rosário de velas, que o vento desfia,
A rezar, a rezar a Ladainha das Lanchas:

Senhora Nagonia!

Olha, acolá!
Que linda vai com seu erro de ortografia...
Quem me dera ir lá!

Senhora Daguarda!

(Ao leme vai o Mestre Zé da Leonor)
Parece uma gaivota: aponta-lhe a espingarda
O caçador!

Senhora d'ajuda!
Ora pro nobis!
Caluda!
Sêmos probes!
Senhor dos ramos
Istrela do mar!
Cá bamos!

Parecem Nossa Senhora, a andar.

Senhora da Luz!

Parece o Farol...

Maim de Jesus!

É tal e qual ela, se lhe dá o sol!

Senhor dos Passos!
Sinhora da Ora!

Águias a voar, pelo mar dentro dos espaços
Parecem ermidas caiadas por fora...

Senhor dos Navegantes!
Senhor de Matuzinhos!

Os mestres ainda são os mesmos dantes:
Lá vai o Bernardo da Silva do Mar,
A mailos quatro filhinhos,
Vascos da Gama, que andam a ensaiar...

Senhora dos aflitos!
Martyr São Sebastião!
Ouvi os nossos gritos!
Deus nos leve pela mão!
Bamos em paz!

Ó lanchas, Deus vos leve pela mão!
Ide em paz!

Ainda lá vejo o Zé da Clara, os Remelgados,
O Jeques, o Pardal, na Nam te perdes,
E das vagas, aos ritmos cadenciados,
As lanchas vão traçando, à flor das águas verdes,
«As armas e os barões assinalados...»

Lá sai a derradeira!
Ainda agarra as que vão na dianteira...
Como ela corre! com que força o Vento a impele:

Bamos com Deus!

Lanchas, ide com Deus! ide e voltai com Ele
Por esse mar de Cristo...
Adeus! adeus! adeus!"

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O sítio onde as coisas acabam

Há dias em que não apetece. Estar no sítio onde as coisas acabam, digo. Estar onde não há. Estar onde há não. No sítio onde há fim. Onde há nada. Há putrefacção, morte, doença, vírus, vacinas. Ausência futura de coisas. Ausência passada de pessoas. Viagens sem retorno. O sítio onde as coisas acabam, enfim, é um sítio onde não apetece estar. Onde não apetece ser.

A Lista

Comprar bróculos. Procurar um fato de chuva para o miúdo. Comprar botas para o outro miúdo. Telefonar ao electricista. Não esquecer a reunião das 14. Online, não presencial. Vender o carro? Levar o lixo para fora. Comprar fraldas. Pesquisar como fazer os miúdos comerem mais vegetais. Descobrir porque é que os miúdos agora não comem sopa. Preparar a recolha de dados com os participantes suecos. Lavar a roupa. E depois estender. E apanhar, e dobrar, e arrumar. E repetir. Até ao infinito. Fazer desporto. Ir à yoga. Voltar a correr. Vender a passadeira? Comprar cortinas novas. E instalar. Pensar em destinos de férias. Quando foi a última vez que fui ao cinema? Acabar de ler os 5 livros que comecei no Verão antes do fim do ano. Procurar o livro emprestado do Herberto Heldér e pô-lo já na mala. Acabar o relatório pendente do projecto 3.2 Aproveitar o tempo. Ir para a cama mais cedo. Mas também acabar de ver Arcane depois dos miúdos irem para a cama. Ter tempo para ir almoçar or jantar fora.