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Três sonetos de Deus ausente - 2

Gostava tanto que Deus existisse!
Como eu havia de ser diferente,
pior ou melhor não sei, se o visse,
na manhã de neblina persistente,

a apanhar conchinhas brancas na praia,
como quem apanha nuvens no céu.
Seria menina e teria a saia
azul, curta, talvez de chita; eu

procuraria ajudá-la a encontrar
a conchinha mais bonita, depois
de ver a espuma das ondas e o ar

a bailar como grandes bailarinos.
E seríamos felizes os dois,
pois ficaríamos sempre meninos.



José Carlos de Vasconcelos, em Repórter do Coração

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O sítio onde as coisas acabam

Há dias em que não apetece. Estar no sítio onde as coisas acabam, digo. Estar onde não há. Estar onde há não. No sítio onde há fim. Onde há nada. Há putrefacção, morte, doença, vírus, vacinas. Ausência futura de coisas. Ausência passada de pessoas. Viagens sem retorno. O sítio onde as coisas acabam, enfim, é um sítio onde não apetece estar. Onde não apetece ser.

A Lista

Comprar bróculos. Procurar um fato de chuva para o miúdo. Comprar botas para o outro miúdo. Telefonar ao electricista. Não esquecer a reunião das 14. Online, não presencial. Vender o carro? Levar o lixo para fora. Comprar fraldas. Pesquisar como fazer os miúdos comerem mais vegetais. Descobrir porque é que os miúdos agora não comem sopa. Preparar a recolha de dados com os participantes suecos. Lavar a roupa. E depois estender. E apanhar, e dobrar, e arrumar. E repetir. Até ao infinito. Fazer desporto. Ir à yoga. Voltar a correr. Vender a passadeira? Comprar cortinas novas. E instalar. Pensar em destinos de férias. Quando foi a última vez que fui ao cinema? Acabar de ler os 5 livros que comecei no Verão antes do fim do ano. Procurar o livro emprestado do Herberto Heldér e pô-lo já na mala. Acabar o relatório pendente do projecto 3.2 Aproveitar o tempo. Ir para a cama mais cedo. Mas também acabar de ver Arcane depois dos miúdos irem para a cama. Ter tempo para ir almoçar or jantar fora.